sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Adolescência

Mensagem a um adolescente fictício por um padrinho de verdade

Caro Roberto, não Robertinho, Beto ou Betinho.
Assim mesmo, meio sério, como se fala com um adulto.
A idéia do tratamento é destacar que chega um dia na nossa vida a partir do qual passamos a ser responsáveis pelo nosso destino. Avalio como seu padrinho, que esse seu dia já chegou e talvez você não tenha se dado conta.

A partir desse dia a nossa felicidade, o nosso êxito profissional, as amizades e os amores que seremos capazes de conquistar e quase todo o resto dependem de nós mesmos, das nossas ações, da nossa conduta, da nossa postura diante dos problemas e das oportunidades. O quase, nesse caso, é para não esquecermos que sobre alguns acontecimentos e da nossa vida não temos controle e nem capacidade de compreendê-los.

Eu sei que você gosta de boas histórias, com poderes, mudanças de destinos, ... e por esse motivo, desejo ardentemente que você dê muita atenção a uma história que pode lhe fazer muito feliz. Quero que você cuide com o máximo de zelo e atenção da sua história, lembrando que dela você é o protagonista e o autor.

Não se esqueça de agradecer a Deus pela família que tem, que pode não ser perfeita, mas é a sua família, a que lhe permitiu estar aqui hoje, vivo, capaz de conduzir seu destino.

Quando lhe chamarem de Betinho, entenda que é uma forma carinhosa de chamá-lo, jamais entenda que você é menor. Saiba que somos todos filhos de Deus, hóspedes do planeta, iguais em dignidade.

Um último pensamento: “ser amado não está em nossas mãos, amar sim, e quando amamos coisas boas acontecem”

Que Deus, que tem todo o poder, lhe abençoe, lhe fortaleça e lhe proteja.
Do seu padrinho

Hamilton Vieira de Oliveira

terça-feira, 24 de maio de 2011

Francisco Esteves Alves

Tributo a um Homem Justo e Bom
Terminadas as exéquias na capela onde Seu Francisco estava sendo velado o Diácono colocou a disposição a palavra a quem quisesse falar algo, como é comum nesses casos. Ninguém falou e não convém julgar ninguém por não ter falado. Não é fácil, não é simples, sobretudo para aqueles de quem mais se espera. No meio do silêncio meu filho de treze anos olhou para mim e seu olhar reclamava a fala em honra do seu avô, a fala que não veio. Enquanto rumávamos para o cemitério fiquei com o sentimento de que deveria ter falado e em situação semelhante, já no campo santo, resolvi me pronunciar. A fala, palavras entre soluços, revelou porquê não devemos julgar quem não se manifesta em situação semelhante, mas me pronunciei e acho que foi bom que tenha feito. Parece que quando ninguém fala o rito não se completa.

Por esses dias que marcaram a dolorosa despedida e por fim a passagem do seu Francisco eu me encontrei, em diferentes momentos, procurando palavras que pudessem expressar a pessoa que ele foi, como se construiu nossa relação, como se desenvolveu entre nós uma constante e respeitosa afetividade, sobretudo nos últimos vinte anos.

Uma das palavras que me ocorreu foi carinho e com ela pude recordar a forma carinhosa como lidava com seus filhos - talvez um pouco mais com as filhas - e a forma igualmente carinhosa com que era tratado por eles e neste caso também, talvez um pouco mais por elas, apesar de que essa possível diferença tenha haver mais com cultura de gênero do que com intensidade de afeto. Esse carinho sempre foi extensivo a sua esposa, netos, genros e noras; penso que a cada um conforme estivesse preparado para recebê-lo. Talvez não fosse preciso dizer isso, que ele tão bem escreveu com gestos, mas pessoas desavisadas e com pouca intimidade poderiam achar que ele aplicava em casa o rigor e a formalidade das relações na caserna. Não aplicava.

Penso que ninguém discordará de que a palavra cuidado expressa um traço marcante do seu jeito de ser, de lidar com aqueles que entendia estarem sob a sua proteção, especialmente sua esposa, filhos, netos, genros, noras e irmãos, sem esquecer a Ana. Essa palavra tem muitos sentidos, mas no Seu Francisco ela significava doação amorosa e zelo, e se é possível amar além dos limites penso que ele fazia isso. Em muitos momentos de nossa relação tive o sentimento de ser cuidado por ele e em nem um deles percebi que ele desejasse em troca algo além de que compartilhássemos esse sentido de cuidar. Não me parecia, portanto, que cuidava por reconhecimento, mas porque o seu amor tinha a autenticidade do sentido bíblico de amar.

Em muitas oportunidades ele expressou que me considerava como a um filho. A mim cabe dizer agora (talvez devesse ter dito antes) que em muitos momentos me senti detentor dessa distinção e muito especialmente todas às vezes, nesses últimos vinte anos, em que fui recebido por ele, mesmo em seus últimos dias no hospital em meio às dificuldades de comunicação que apresentou nesse período. Não recordo nenhum encontro no qual tenha sido recebido com a formalidade reservada às visitas, mesmo as desejadas. Via de regra desfrutei do sentimento de um pai que bem acolhe aos filhos independentemente das turbulências que a vida impõe às relações. No nosso caso foram muitas as dificuldades como foram muitos os nossos encontros sob bons ventos, porém a sua conduta era a mesma, impregnada do mais autêntico acolhimento.

Em seu funeral ouvi especulações sobre razões que poderiam ter agravado seu estado de saúde e apressado sua partida. Dentre elas três afastamentos importantes: o da filha em 2007 e mais recentemente o do outro filho e do neto, que mudaram de cidade por imposição profissional. Arrisco afirmar que os afastamentos lhe foram dolorosos e difíceis, mas não acho que tenham agravado a doença contra a qual já lutava bravamente há mais tempo. Sofreu junto e intensamente o sofrimento e a ausência definitiva da filha, mas de forma altiva, digna e equilibrada, com a experiência dos que sabem que a vida nem sempre é uma sucessão de alegrias, dos que sabem que o nosso poder é subordinado a um desígnio maior, fora do alcance da nossa capacidade de compreensão. Nos dois casos sofreu principalmente a dor da impossibilidade de fazer o que melhor sabia: amar de perto.

Finalizo este testemunho passado exatamente um mês da sua despedida ocorrida na madrugada do dia 12 de abril de 2011, logo após a vitória do nosso combalido Leão Azul de 1x0 sobre o Cametá. Ao constatar a relativa facilidade com que produzi esta breve homenagem, percebi o quanto tínhamos em comum e as razões da minha afeição por esse homem com quem tive o privilégio de conviver nas duas últimas décadas. Talvez nossa maior semelhança tenha sido um gosto especial em proteger e cuidar dos que elegemos. Tínhamos diferenças de certo, as principais no campo das ideologias e da política (e dada as nossas trajetórias de vida não seria razoável se assim não fosse), mas outra característica comum jamais permitiu que tais diferenças interferissem em nossa relação: cada um ao seu modo éramos democratas, basicamente respeitávamos o direito que cada um tem de ser diferente. Que ele esteja vivo em nossas mentes e nos sirva de exemplo!
Hamilton V Oliveira

sexta-feira, 25 de março de 2011

Um presente para a Biblioteca Púbica Arthur Vianna

Hoje, 25/03/2011, a Biblioteca Púbica Estadual do Pará “Arthur Vianna” completa 140 anos. Nasceu de uma mobilização popular com a participação de membros do Clero Católico, profissionais liberais, estudantes, empresários, pessoas ligadas à Educação e a Cultura e outras figuras representativas da sociedade paraense da época de 1871. Não nasceu por conveniência política, mas por necessidade social explicitada quando o Pará ainda era província.

Viveu seu ápice, e penso que o início de um incômodo declínio, quando se mudou para o prédio projetado pelo arquiteto Euler Arruda para abrigá-la na dimensão de sua importância e dignidade, o famigerado CENTUR. Foi desde o início da ocupação dos quatro andares do referido prédio, apertada nos dois andares do meio, entre a estrutura administrativa da Secretaria de Cultura - SECULT no quarto andar e o auditório improvisado para abrigar o Congresso Brasileiro dos Agentes de Viagem, no primeiro. Registre-se que à época, segunda metade dos anos oitenta, Belém não possuía Centro de Convenções.

A já centenária Biblioteca Pública nesse período não teve apenas o seu espaço físico tirado, possivelmente o maior abalo que sofreu foi em sua identidade, passou a ser conhecida e referida comumente como a biblioteca do CENTUR, e o que é o CENTUR senão o apelido de um prédio, uma espécie de sigla cuja correspondência real mais próxima é a Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves - FCPTN.

Outro ataque que passou a sofrer a tradicional Biblioteca, não sei se há na literatura um termo mais apropriado para isso, foi uma espécie de parasitismo administrativo pela própria instituição que deveria abrigá-la, protegê-la, zelar pelo cumprimento da sua função social. Sucessivas mudanças na estrutura da FCPTN levaram a Biblioteca à desprestigiada condição de gerência no mesmo nível de um setor que integra a estrutura de qualquer biblioteca no mundo como o Processamento Técnico. Nessa mesma linha lhe tiraram serviços que criou como o Carro Biblioteca, que quando nasceu, em uma Kombi adaptada, conseguia ser mais efetivo do que hoje, subordinado a outra gerência.

Está a nossa Biblioteca Publica, numa estranha subordinação administrativa do mais geral ao mais específico, integrando uma Diretoria de Leitura e Informação. Basta ler o Manifesto da UNESCO para as Bibliotecas Públicas para perceber que sua função social é bem mais ampla do que leitura e informação, essa é uma de suas funções e esse poderia ser um setor seu. Parece mais pomposo, mas é impróprio não apenas do ponto de vista administrativo, mas também do político e ético.

Hoje, em festa pelo seu 140º aniversário, a Biblioteca Pública Arthur Vianna, em honra da iniciativa popular que determinou sua criação, merece e espera dos atuais ocupantes do poder no Estado do Pará que lhe assegurem um futuro e que lhe ofereçam o presente que lhe é devido: justiça, na forma de reconhecimento e valorização.