Quando
da aprovação pelo Congresso Nacional, em maio de 2010, da Lei 12.244, que trata
da universalização das bibliotecas nas instituições de ensino do Brasil, o
senador, pelo Distrito Federal, Cristovam Buarque afirmou que o projeto possuía
dois defeitos “demorou tantas décadas para ser aprovado e estabelece um
prazo longo para sua execução” e completou “os sistemas de ensino poderiam
reduzir de dez para cinco anos o prazo de instalação das bibliotecas”.
A
Lei, publicada no Diário Oficial da União em 25 de maio de 2010, é gigantesca
na intenção e pequena em volume de texto; de forma simples e direta define sua
abrangência, conceitua biblioteca, estabelece um acervo mínimo relacionado ao
número de alunos de cada escola, define um prazo máximo de dez anos para sua
efetivação pelos sistemas de ensino e determina a observância à profissão do
bibliotecário nos termos da lei que a regulamenta.
Para
além do sucinto conceito de biblioteca da Lei Federal é oportuno observar sobre
a questão as proposições da Federação Internacional das Associações de
Bibliotecários - IFLA, referendadas pela UNESCO, que atribui à Biblioteca
Escolar, dentre outras, a responsabilidade de habilitar os estudantes para a
aprendizagem ao longo da vida, de desenvolver sua imaginação, de prepará-los para
viver como cidadãos responsáveis.
O
Prefeito de Belém do Pará, às vésperas da cidade completar 400 anos de
fundação, achou por bem fazer diferente do que sugeriu o senador. Por meio de
um Projeto de Lei encaminhado à Câmara Municipal, propõe limitar a 23 o número
de bibliotecários no âmbito da administração municipal. Em sua defesa o
prefeito poderia argumentar que o número de cargos é superior ao existente, mas
isso não invalida o fato de que o mesmo é insuficiente e vergonhoso.
Florianópolis,
com um terço da população de Belém, já cumpriu a lei de universalização das
bibliotecas nas escolas municipais que são cuidadas por mais bibliotecários do
que propõe o nosso prefeito para toda a nossa administração municipal. Para não
ir tão longe é triste pensar que talvez nossa capital sequer alcance o
município de Tomé-Açu, no próprio Estado do Pará, que recentemente inaugurou
sua quinta Biblioteca Pública Municipal.
Para
além da antecipação da intenção de descumprir a Lei Federal, cuja competência
legal para exigir o cumprimento é do MPU, o ato é difícil de entender e de
classificar. À luz da teoria administrativa, por exemplo, o ato desvela um
gestor que ao invés de estabelecer objetivos e metas sociais para o município, de
buscar a qualidade do processo educativo, estranhamente escolhe limitar um
fundamental e poderoso instrumento de mudança.
A
maior Biblioteca Pública de Belém, a “Arthur Vianna”, não é municipal, funciona
no prédio apelidado de CENTUR sob a gestão do Governo do Estado, por meio da Fundação
Cultural do Pará. Em março de 2016 completará 145 anos. Nasceu quando o Pará
era província e o Brasil, império. Foi fundada em 1871, a partir de uma
mobilização popular com a participação de membros do Clero Católico,
profissionais liberais, estudantes, empresários, pessoas ligadas à Educação e à
Cultura e outras figuras representativas da sociedade paraense da época; não
nasceu por conveniência política, mas por necessidade e exigência social.
Nossos
políticos talvez estejam mais pobres em mentalidade e visão, mas a população
desta cidade não pode ter regredido a ponto de não se insubordinar civicamente
contra uma medida culturalmente tão pobre e sem fundamento. Bibliotecários por
iniciativa própria e de suas instituições procuram se mobilizar contra a medida,
mas a causa não é apenas dos bibliotecários, a causa é da sociedade.
O
ato da administração municipal exige vigilância, posicionamento e ação. Ao
limitar o número de cargos de bibliotecário, a gestão municipal compromete o
funcionamento das bibliotecas, afeta ou inviabiliza políticas públicas de
leitura, soma com a ignorância e com a incivilidade, demonstra pouco zelo com o
objetivo estratégico de tornar nossa cidade melhor por meio da educação e da
cultura.
Os
problemas da cidade são muitos, complexos e desafiadores, mas não podemos tratá-los
como insolúveis. Nessa questão específica que inclui a promoção da leitura e o
acesso a todo tipo de informação por meio das bibliotecas, uma medida bem
razoável seria a aprovação de um “Plano Municipal do Livro, Leitura e
Bibliotecas – PMLLB”, o que muitas capitais brasileiras já o possuem. Seria um
belo presente de 400 anos e Belém bem que o merece.